terça-feira, 24 de setembro de 2013

O homem distorce o significado de Deus. Interesse político, desconfio.

Quando os escravos africanos chegaram ao Brasil, suas tribos não foram respeitadas. Sem distinguir joio de trigo, os portugueses misturaram africanos iorubas - principalmente representados pelas nações Queto e Nagô, que tinham uma religião arcaica muito bem estruturada - com os haussas e os mandingas, que já haviam sido islamizados e trouxeram para o Brasil um islamismo sincretizado com algumas crenças ancestrais, traços culturais seus. Para evitar motins, os escravos negros eram separados de seus familiares e de outros negros da sua comunidade, criando-se aí a sensação de não pertencimento nesses novos grupos misturados. 

Esses negros praticavam tradições religiosas que implicavam contato com espíritos. Práticas essas que foram vistas com menos espanto a partir do século 19, quando o kardecismo surgiu e se expandiu, aliviando o estranhamento da comunicação com espíritos nas reuniões de mesa branca. Allan Kardec compôs uma doutrina cristã a partir de mensagens recebidas de espíritos de mortos, obtidas através de médiuns, também chamados aparelhos. 

Uma fatia da elite brasileira, de cultura europeia, aceitou prontamente a doutrina kardecista. Nesse sentido, a tradição espírita facilitou aos grupos de herança cultural nitidamente europeia, a aceitação de fenômenos míticos negros. Nas palavras do especialista e pesquisador de religiões afro Bentto de Lima, "nada mais oportuno para o brasileiro de elite cercado pelas magias do povo". 


O contato com os mortos, a partir do espiritismo kardecista, permitiu a essa elite brasileira, culturalmente europeia, o contato com mortos ilustres da cultura branca. Ressalto que a postura dessa elite em lidar com menor estranhamento com o caráter espiritual das tradições religiosas afros, se deu após a libertação dos escravos, quando eles passaram a ser considerados pessoas. 


O importante é perceber em toda essa história como os colonizadores portugueses obtiveram grande êxito no enraizamento de sua cultura nos brasileiros, transferindo a nós, com sucesso, o hábito de tratar com desrespeito e intolerância práticas culturais diferentes das europeias, como fizeram ao desconstituir os grupos sociais dos africanos traficados para o Brasil.


Com sucesso também transferiram aos brasileiros a hipocrisia, entendida por mim como a habilidade de apontar o erro no outro, daquele que não tem condições de reconhecer em si mesmo seus próprios erros e incoerências. 


O contato com espíritos praticado pelos negros há gerações, foi tolerável e parcialmente aceito na sociedade brasileira quando a elite local muito influenciada pela cultural européia encontrou nessa possibilidade de comunicação com os mortos, um interesse. 


Os registros históricos, relatos e outras fontes secundárias e primárias são essenciais para nossa compreensão sobre nós mesmos. Tenho dito que o maior dos pecados é a hipocrisia. Mas como já conta uma historinha bíblica, mais fácil ver uma farpa no olho do outro, do que uma trave em nossos próprios olhos. 


Cada tradição religiosa discorre sobre uma fatia da imensidão que é a subjetividade, também chamada como vida espiritual, céu, inferno, após a morte ou como queiram chamar. 


Defender que a sua religião é a melhor porque ela sim dispões sobre a verdade é um ato de ignorância, leia-se desconhecimento sobre as demais formas de interpretação dessa vida não-material. Deus é amor, em português claro, quer dizer que Deus é respeito, Deus é tolerância, Deus é compreensão.